O mundo todo está estarrecido com o que aconteceu no domingo (09/04) em um avião da companhia United Airlines. Um homem foi retirado à força da aeronave porque a empresa precisava transportar quatro tripulantes, mesmo com overbooking. O que podemos aprender desse terrível episódio?
A United Airlines sentiu a fúria da internet no infeliz episódio que ocorreu no domingo. A segunda maior linha aérea dos EUA com mais de 91 anos de atuação sofreu uma queda brusca nas suas ações de mercado (controlada pela United Continental Holdings), perdendo cerca de 755 milhões de euros em 5 dias. Tudo isso porque vídeos foram divulgados mostrando o passageiro David Dao, de 69 anos, sendo retirado do voo 3411 à força por três policiais. Veja o vídeo:
Audra D. Bridges, que publicou o vídeo, relatou que David disse para a tripulação que era médico e tinha pacientes para atender de manhã e por isso não podia sair. O passageiro bateu com a cabeça no braço do assento e foi arrastado para fora por agentes de segurança do aeroporto.
O problema foi causado porque a empresa precisava transportar 4 tripulantes da companhia para Louisville, o destino do voo. A aeronave partia de Chicago e estava lotada de passageiros. A companhia perguntou se havia voluntários para se retirar de voo, oferecendo US$ 400 e uma estada em hotel até os voluntários tomarem outro voo para Louisville às 3h00 da segunda-feira. Ninguém se manifestou. A empresa afirmou que o avião não decolaria se ninguém saísse, e a oferta subiu para 800 dólares mas, mesmo assim, os passageiros se recusaram a sair. Então, escolheram 4 passageiros aleatórios para serem retirados da aeronave.
Vazamento do e-mail
Depois do vídeo ter viralizado, um e-mail do CEO Oscar Muñoz vazou para a imprensa. No e-mail Munoz parabenizava a atitude da equipe por ter retirado o passageiro.
“Quero elogiá-los por continuarem indo além para garantir que a gente voe corretamente”.
E ainda acrescenta:
“Cada vez ele se recusava e ficava mais e mais inconveniente e beligerante”.
Mudança
Logo depois do vazamento desse e-mail, o CEO mudou sua posição e divulgou uma nota pedindo desculpas pelo ocorrido.
“O evento verdadeiramente terrível ocorreu neste voo. Isso provocou muitas respostas de todos nós: indignação, raiva, decepção. Compartilho todos esses sentimentos e um acima de tudo: minhas mais profundas desculpas pelo que aconteceu. Como você, continuo perturbado com o que aconteceu neste voo e peço profundas desculpas ao cliente removido à força e à todas as demais pessoas a bordo.
Ninguém deve ser maltratado desta forma. Eu quero que você saiba que nós assumimos a responsabilidade total pelo que aconteceu e vamos trabalhar para resolvê-lo. Nunca é tarde demais para fazer a coisa certa. Tenho o compromisso com os nossos clientes e funcionários de que vamos consertar o que está errado.
Então isso nunca irá acontece novamente. Isso irá incluir uma revisão completa de movimento da tripulação, as nossas políticas para incentivar voluntários nestas situações, como lidar em situações de overbooking e um exame de como fazer em parceria com os aeroportos locais e a aplicação da lei.
Vamos comunicar os resultados de nossa revisão até 30 de abril. Eu prometo a você que vamos fazer melhor.”
Apesar das diversas declarações feitas por Muñoz, a internet se solidarizou com David Dao e abriu uma petição online pedindo a renúncia do CEO. A petição tem mais de 67.000 apoiadores e pretende chegar a 75.000. Além disso, muitos programas, sites e canais de humor tiraram sarro da companhia pelo episódio.
David Dao já começou a agir contra a United Airlines. Depois de se recuperar dos ferimentos causados pela a atitude do policial, David, juntamente com seus advogados, entrou com uma papelada em um tribunal de Chicago exigindo que a United preserve todos os vídeos de vigilância a bordo do voo, a gravação de voz de cabine de pilotagem, a lista de passageiros, a lista de tripulantes e todos os relatórios de incidentes que a United tinha preparado.
De acordo com o Departamento de Aviação de Chicago, o policial que arrastou o passageiro foi afastado do cargo temporariamente.
O que aprendemos com isso?
Como falamos no nosso post Como as empresas se comportam em um momento de crise na marca?, as marcas tomam diversas atitudes para contornar os escândalos que mancham a história da marca. Pedidos de desculpas e esclarecimentos sobre o ocorrido dão o alívio de ter uma resposta. Mas será que isso é tudo? A incompetência da United Airlines de deixar sua própria tripulação sem transporte mostra as falhas do sistema organizacional. O pior ainda talvez seja a incapacidade dos tripulantes a bordo de se manifestarem sobre o absurdo ocorrido e não questionarem a atitude do policial que não tinha conexão com a companhia. Mesmo assim, ele atuou bruscamente dentro do avião, com um passageiro da empresa.
Será que as empresas estão preparando seus funcionários corretamente? Mais que isso, será que a própria empresa age dentro da visão, valor e missão que elas mesmas estabelecem? Aparentemente, para a United Airlines, não. Se o próprio CEO alegou que a atitude do policial foi correta, quem somos nós para saber o que os funcionários pensam vendo seu superior com esse pensamento.
Devemos lembrar que, antes de empresários, somos também clientes. E de maneira alguma queremos ser tratados mal, correto? A política das empresas deve ser de colocar o consumidor acima de tudo. É errôneo dizer, no entanto, que ‘o cliente tem sempre razão’. Em muitos casos isso não é verdade, mas cabe a empresa agir da forma mais correta e íntegra possível para achar uma solução.
Mostramos que a United Airlines sofreu uma perda irreparável depois desse episódio. Certamente muitos devem estar pensando no prejuízo financeiro – que ainda não acabou, se depender de ações futuras movidas por David Dao.
Mas devemos pensar além disso. Devemos colocar o dinheiro como a parte mais importante da equação? Não seria mais humano pensar nos prejuízos causado à integridade das pessoas? Imagine se o ferimento fosse mais grave no Dao, resultante de uma estupidez da própria empresa.
Devo frisar aqui que nos EUA os problemas de overbooking são comuns. Geralmente acontece esses problemas de falta de assentos e pessoas que devem deixar o avião. A lei americana diz que, caso aconteça a situação de overbooking, a empresa pode sim retirar passageiros, desde que haja uma compensação. Talvez não seja o método mais correto de se prosseguir nesse tipo de transporte, mas cabe a comunidade americana decidir. Mas nunca na história teve um episódio tão extremo como esse.
A United Airlines não tem histórico muito bom com tratamento aos consumidores. Foi revelado agora que, uma semana antes desse incidente, Geoff Fearns foi ameaçado a sair algemado do avião de um voo entre o Havaí e Los Angeles. A empresa também abordou o passageiro quando ele já estava acomodado em seu assento, e alegou que a pessoa a ocupar era “mais importante que ele”.
“Referiram ainda que tinham uma lista de prioritários e a outra pessoa estava num nível mais alto do que eu, apesar de ter um bilhete de primeira classe e ser um passageiro frequente”. – Geoff Fearns
Mesmo sendo prevista em lei, será que uma empresa tem o direito de transcender os limites e atuar fisicamente sobre um cliente?
Não tem. Ela não tem esse direito. Ela não pode, de forma alguma, usar a força, a violência, a ameaça nos seus próprios consumidores. Parece algo tão óbvio, mas que, aparentemente, deve ser dito.
Ética, caros leitores, é o que deve transcender. E respeito é o que deve voar mais alto, muito acima do dinheiro.
#flythefriendlyskies @united no words. This poor man!! pic.twitter.com/rn0rbeckwT
— Kaylyn Davis (@kaylyn_davis) April 10, 2017
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